quarta-feira, 15 de julho de 2009
coisas e blaus
segunda-feira, 13 de julho de 2009
domingo, 12 de julho de 2009
final alternativo para "era uma vez"
Se você não leu o texto de ontem, não leia isso. Primeiro que você não vai entender nada. Segundo que perde totalmente a graça...
O chuveiro desligou. Os dois pareceram ter percebido isso ao mesmo tempo, e pararam de discutir instantaneamente. Trocam olhares afoitos. Cinderela parecia desesperada. Jacque, ainda que assustado, parecia divertir-se.
A porta do banheiro foi destrancada com um estalo. Ficaram esperando, sem reação. A maçaneta girou. O movimento das dobradiças fez um grunhido arrastado. A porta foi-se abrindo devagar, a fumaça de um banho quente inundando o quarto.
Um vulto gigantesco brotou no meio da fumaça. A porta do banheiro estava agora escancarada, mas ainda era impossível reconhecer o vulto que surgia entranhado nela, a não ser que...
...Ele desse um passo para a frente.
- Shrek?
sábado, 11 de julho de 2009
era uma vez
Cinderela acordou sobressaltada. Abriu os olhos tão rápida e subitamente que uma pontada lhe incidiu na cabeça. Tudo girava à sua volta. Percebeu então que a dor em sua cabeça não era uma pontada momentânea, e sim um latejo permanente. Assim ficava mais difícil de colocar os pensamentos em ordem. Tentava com todas as forças focalizar o ambiente em que se encontrava.
Empurrou os lençóis desajeitadamente e sentou-se. Seus braços a sustentavam, envergados às suas costas. Aquela superfície oscilava em ondas, e um de seus braços vacilou. Ela empurrou aquilo delicadamente com uma das mãos. E de fato ondas se propagavam, balançando todo o seu corpo. Um colchão d’água. Aquilo certamente não era o palácio. Não fazia a menor idéia de que lugar era aquele.
Olhou para o teto, estreitando os olhos até que virassem fendas. Demorou um tempo até que percebesse que se encarava lá de cima. Do espelho, uma Cinderela descabelada e meio entorpecida olhava para baixo, o pescoço esticado, uma cama redonda e balançante em volta. Ela ainda não conseguia entender onde estava, ou o que aquilo significava.
Ainda estava um pouco tonta, mas já conseguia observar as coisas a seu redor com maior discrepância dos detalhes. Olhou para o lado. O edredom estampado de onça estava completamente remexido e embolado, mas não havia sinal algum de ter mais nenhuma pessoa por ali. Então ela se pegou pensado: “E por que teria?”
Empurrou a colcha com as pernas até que ela se desenrolasse de seu corpo por completo. Notou, envergonhada, que estava semi-nua. Aquela situação não lhe parecia estranha. Abraçou as pernas escondendo o corpo, lutando com força para se lembrar da noite anterior. Sua cabeça ainda latejava, agora com uma intensidade ainda mais perturbante.
Olhou ao redor. Aquele lugar era de extremo mau gosto. Em contraste com a decoração delicada, repleta de nuanças refinadas do palácio a que estava acostumada, aquele lugar era carregado de extravagância e exageros. As cores eram pesadas e estimulantes. Era quase vulgar. Todos aqueles objetos circulares e dourado fulgurantes, desde o pé da cama até a mesa e cadeiras, com curvaturas insinuantes. Quase fálicas. O ar não era só denso. Ele cheirava a sexo. Relances da noite anterior começavam a pipocar em sua cabeça, de forma desordenada e incoerente. Bateu com a mão na testa, repreendendo-se. “Ah, não... de novo não.”
Começou a ouvir um barulho do outro lado da porta. Pareciam arranhões, pancadinhas fracas, vindas da altura do rodapé. Aquilo não a assustou. “Jacque”, pensou. Jogou os pés para fora da cama bruscamente, caçando com os olhos alguma coisa que pudesse usar para cobrir o corpo. Deparou-se com um roupão vinho pendurado em um cabide na porta do banheiro, e jogou-o sobre os ombros, dando um nó frouxo em torno da cintura. Conseguia ouvir o barulho do chuveiro ligando, e ficou paralisada por um momento. Não tinha percebido até agora como seu corpo estava dolorido. Aparentemente, a ressaca era das brabas.
Quando chegou na porta, ajoelhou-se no chão, uma das mãos pendurada na maçaneta, a outra estendida com a palma para cima, encostada no chão. Abriu uma frestinha da porta, o suficiente para que sua mão passasse para o outro lado. Em poucos segundos já sentia o contato das pequenas patinhas afoitas em sua palma, fazendo-lhe cócegas. Recolheu a mão rapidamente, fechando a porta com a outra em um baque surdo.
- Puta que p... – gritava o ratinho com a voz fina esganiçada.
- Shh, você tá falando alto demais – ela apontou sugestivamente para a porta fechada do banheiro – E minha cabeça tá doendo.
- Cara, você é muito estúpida mesmo. Quantas vezes eu já te disse que se alguém te falar “posso te dar um Boa Noite Cinderela?” ele não está sendo educado e simplesmente querendo se despedir de você? Acho que essa coisa de loira burra não é só lenda não. Depois que Aurora ficou por séculos adormecida, e olha que nem Cinderela ela se chama...
- Jacque, eu te falei que isso aconteceu só uma vez. Eu não sou tão imbecíl assim.
- Ah, e você falou o quê então? “Meu nome é Alice, vim do País das Maravilhas”. – remedou, gesticulando – Também já te disse que aquele filho da mãe do Lewis Carroll era um padre pedófilo e drogado, e qualquer um ia confundir suas intenções se você falasse uma coisa dessas...
- Não, não, eu nunca repetiria isso Jacque! – o rubor começava a tomar conta das maçãs de seu rosto.
- Porra, então o que aconteceu dessa vez? – Jacque estava visivelmente alterado. Sua voz conseguiu afinar mais ainda, subindo duas oitavas. Seus olhos estavam esbugalhados e irreconhecíveis – Olha só, já cansei de limpar sua barra com o príncipe. Se você gosta de pular a cerca, se vira de agora em diante.
- Mas ele...
- Tá, tá, eu sei que ele é viado e que o casamento de vocês é arranjado. E que por isso, tecnicamente, você não está pulando a cerca.
- Então! Você não idéia de como é frustrante...
- Mas ele ia ficar uma arara se descobrisse isso, ia soltar a franga. E eu não sei o que é pior: a imprensa descobrindo você, a reles plebéia que virou princesa por causa de uma idéia idiota daquela gagá da Fada Madrinha, está chifrando o príncipe encantado mais cobiçado da Europa em um motel pé rapado como esse ou descobrindo que o príncipe é uma baitola.
- Ele sabe, e ele não se importa! Você sabe que ele tem um caso com o cocheiro...
- Quem não sabe disso? Até a rainha da França sabe disso e finge que não vê! – Jacque balançava frenético as patinhas ariscas acima da cabeça – O cocheiro, aliás, caso a madame tenha se esquecido, é por acaso um rato que chegou depois de meia-noite em casa e vai ser um homem repugnante para sempre por causa de um feitiço estúpido daquela Fada Madrinha idiota! – Jacque cuspia suas palavras com ódio.
- Tá, tudo bem, eu já sei como você se sente a respeito da Fada... Vamos embora, me ajude a sair daqui. Você tem razão. Eu sinceramente não quero virar um escândalo nacional. E ele pode sair do banheiro a qualquer momento...
- “Vamos embora Jacque, me ajuda”, tudo eu, tudo eu. Bando de aristocrata imprestável. Você sabe que eu gosto de você Cinderela, mas você tá abusando da sua sorte. Minha boa vontade para com você está por um fio. – Jacque apontava para o nariz dela incriminadoramente.
- Desculpa Jacque. Prometo que vou ser mais cuidadosa da próxima vez.
- Próxima vez? Não senhora, você entendeu tudo errado! Não vai ter uma próxima vez! Deus do céu, e eu que pensei que a sua amizade com a Pura de Neve ia botar bom senso nessa sua cabecinha oca... – ele dava soquinhos fracos no cocuruto loiro da princesa.
- É Branca de Neve, Jacque... E você só diz isso porque ela ficou por nove meses morando com sete anões e não engravidou de nenhum deles...
- ... Porque ela era boa e pura e estava esperando seu grande amor chegar para a buscar e eles serem felizes para sempre! – Jacque piscava os olhos, com uma expressão de profunda esperança e deleite.
- Jacque, deixa de baboseira! Essas coisas não acontecem nem em contos de fadas... – Cinderela debochava do amiguinho – Todo mundo sabe que a Branca de Neve só não engravidou porque ela é um baita dum traveco. E nem branca ela é de verdade. Ela tinha vitiligo e...
- ...Fez a mesma cirurgia do Michael Jackson, tá, tá eu sei. Depois a gente discute. – de repente sua voz se tornou urgente – É melhor você catar suas coisas antes que aquele zé mané resolva sair do banheiro... – ele apontou para os pés da mesinha de cabeceira. Ali jazia o vestido azul celeste, todo embolado e sujo de geléia de morango – pelo visto a noite foi boa... – comentou sarcasticamente.
- Cale a boca. Você viu meu sapatinho de cristal?
- Um tá ali... o outro deve ser aqueles cacos espatifados ali naquele canto...
- Aah nãão, gostava tanto dele... – Cinderela debruçava-se sobre as evidências, catando os pedaços um a um e embrulhando-os com cuidado no vestido de cetim.
- Vamos combinar que um sapato feito de cristal não é lá uma idéia muito brilhante. Só aquela Fada Madrinha mesmo...– Jacque foi repreendido com um olhar de Cinderela, que abria a porta em silêncio para que fossem embora imperceptivelmente – Ainda mais você, constantemente embriagada e em boates... e querida, ter engordado uns quilinhos também não ajuda nada em colocar um sapato que pode quebrar a qualquer momento... um sapato de mármore seria obviamente mais apropriado...
- Fica quieto! – disse Cinderela rispidamente, pegando Jacque com uma das mãos, segurando as roupas e os restos dos sapatos com o outro braço, enquanto deslizava nas pontas dos pés até a porta já aberta.
- Eu com certeza seria uma Fada Madrinha muito mais decente. E se eu tivesse uma varinha de condão...
- ...Eu a enfiaria no seu...!
- Mas que grosseria! – Jacque interrompeu-a – Onde estão seus bons modos de doce princesa indefesa? – a porta já havia sido fechada sem ruídos às suas costas.
Eles desceram o corredor afobadamente, ainda trocando blasfêmias aos sussurros, deixando a cena do crime para trás.
E eles viveram felizes para sempre.
sexta-feira, 10 de julho de 2009
da janela do carona
Estavam a esperar o sinal abrir. A babá carregava os dois pequenos, um em cada mão. Seria o primeiro dia de aula? O menino de uns seis anos carregava consigo uma mochila gigantesca, de porte maior que o seu, como hoje em dia costumam fabricar, daquelas de rodinha de plástico, com algum super-herói da moda estampado atrás. Na outra mão da babá, pendurava-se a menina, uns dois anos mais nova, a merendeira rosa pendendo nas costas.
Inquieto, o menino equilibrava-se no meio-fio. O sinal abriu, e juntos, os dois foram guiados pela babá. Ao descer do meio fio, a mochila de rodinha quicou no asfalto, desprendendo-se então da mão do menino, sem que ele notasse. Sem que isso o perturbasse, continuou o percurso sem a mochila e sem sentir sua falta.
A menina, a primeira a notar o ato distraído do irmão desatento, começou a gritar no meio da rua, puxando a babá, apontando freneticamente para a mochila, reclamando com o irmão.
No alvoroço, a babá se esforçava apreensiva e inutilmente. Uma cega tentativa de segurar duas crianças na pista e de resgatar uma mochila esquecida.
quinta-feira, 9 de julho de 2009
análise de "conquista" do claudinho e buchecha
Estou louco prá te ver
Oh yes!
Cabe, Thurururu
Entre nós dois, um querer
Iê, iê, iê, iê!
(2x)
E mesmo ao passar do tempo
Hei de ver
Você junto à mim
Nada se compara
A esse prazer
Arder, enfim
Vou gozar, delirar
Se com você, sonhar
Conquistar, esse amor
Que não se acabará
Oh yes, oh yes!
Olha eu te amo
E quero tanto
Beijar teu corpo nú
Não, não é mentira
Nem hipocrisia, é amor
Com você, tudo fica blue...(2x)
quarta-feira, 8 de julho de 2009
despedida
Helena tentava localizá-lo em meio à multidão. O porto de madeira úmida estalava sob seus pés aflitos. Não era a única que estava sendo trocada pelo mar aquela tarde. Muitos marujos se despediam de suas esposas e filhos, sem saber o que o destino lhes aguardava e se voltariam a se reencontrar ou não. Ela olhou para cima, as nuvens cinzentas e pesadas prenunciando chuva a qualquer momento.
Helena avistou-o. Teria que esconder-lhe o choro, engolir toda a tristeza que a pungia e ser forte. Correu pelo deque de madeira, esbarrando em quem quer que fosse que estivesse na frente, sem pedir perdão. Ele estava de costas, esperando-a.
Helena freou repentinamente. Deixou que as lágrimas rolassem por suas bochechas e logo arrependeu-se, levando as mãos ao rosto para secá-las furiosamente, deixando sua pele marcada de vermelho. Ele a repreenderia quando percebesse.
Estavam a alguns metros de distância um do outro, mas era o suficiente para que Pedro sentisse sua presença. Virou-se muito devagar para a sua direção, girando nos tornozelos. O tumulto à sua volta, a gritaria de crianças desamparadas, o choro silencioso que precede a espera tortuosa de noivas e esposas, nada disso importava. Tudo à sua volta tornou-se muito distante e vazio quando os olhos de Pedro encontraram os de Helena.
Ele encarou-a inexpressivo por uns longos segundos, porém não tão longos quanto Pedro desejava. Não tão longos o suficiente para que aqueles olhos mergulhassem dentro dos seus e por lá permanecessem por toda uma eternidade, para que pudesse tê-los consigo para todo o sempre.
Helena avançou alguns passos e Pedro permaneceu inerte e sem reação. Ela tocou-lhe as mãos com os dedos e Pedro fechou os olhos. Ele sentiu sua respiração afobada roçando seu pescoço e assim permaneceram por um tempo.
Uma chuva fina começou a cair. Cortavam a face de Pedro como alfinetadas impiedosas, e ao escorrerem, as sentia como sangue. A barra do vestido de Helena estava suja de terra, e agora tornava-se enlameada. Mas ela não se importava. Nada mais importava.
- Não vá, Pedro. Não vá. – Saiu-lhe da boca como um suplício. Ele abriu os olhos percebendo que a tripulação já havia embarcado. Crianças e mulheres se debruçavam chorosas pelo anteparo de madeira, que se interpunha entre elas e seus homens do mar. Pedro tocou o rosto róseo e delicado de Helena com as mãos brutas e calejadas de marujo. Beijou-lhe a testa e partiu sem olhar para trás.
(um pouquinho de sentimentalismo barato)
terça-feira, 7 de julho de 2009
olho ardido e halls de menta
Hoje passei por um drama. Foi tenso. 99% coisa da minha cabeça, é claro. Eu cheguei desesperada e com um olho meio capenga no hospital universitário, depois de perambular que nem uma barata tonta pelo primeiro andar e descobrir que o ambulatório ficava só no segundo. Deixe-me explicar melhor: eu uso lentes de contato desde os nove anos de idade e aquilo nunca tinha acontecido comigo antes. E olha que eu já judiei com meu olho de milhares de maneiras improváveis, como puxando sem querer a membrana conjuntiva, pensando que fosse a lente e ficando com a visão turva e retorcida, quase ganhando uma cegueira de brinde com isso. Como é de se esperar, por essas e outras eu já era um pouco traumatizada.
O que aconteceu foi que, enquanto eu estava no ônibus a caminho da faculdade, a lente do olho esquerdo saiu da córnea e se embolou em algum canto do olho que eu não conseguia tirar. Até aí normal, tudo bem. Eu tenho que admitir que nunca fui muito responsável com essa coisa de higiene do olho, ficar limpando com sorinho, levar estojinho com colírio, espelhinho, blá blá blá, nhé nhé nhé. Mas mesmo assim, isso acontece o tempo todo, já tô acostumada. Quem usa lente sabe que isso é bem comum. Só que ainda faltava uma hora pra eu chegar, e eu nunca tinha ficado tanto tempo com uma coisa embolada pinicando meu olho. Aquilo tava começando a me deixar agoniada.
Cheguei na faculdade atrasada para a primeira aula e com o olho ainda fechado. Fui até o banheiro (que estava interditado) e empurrando os carrinhos de limpeza para o lado me deparei com um olho inchado e vermelho me encarando pelo espelho. Comecei a buscar furiosamente por uma lente perdida. Não a encontrei. E isso nunca tinha visto antes.
Corri desamparada até o hospital, não muito longe do meu prédio. E como já disse, cheguei desesperada e com um olho capenga no ambulatório de oftalmologia, no final do corredor do segundo andar. Fui até a atendente e contei rapidamente meu problema. Olhei meu relógio e já tinha perdido uns quinze minutos de aula. Ela anotou tudo que eu disse em uma folha de papel rasgada e falou que ainda ia demorar um pouquinho pra eu ser atendida por um residente. Tinham quarenta pessoas na minha frente.
Eu busquei um lugar para me sentar no meio de toda aquela gente. Acabei encontrando um banco de madeira com um lugar vago bem no meio. Aquilo ali fedia a mijo.
Fiquei uma meia hora sentada ali. Uma velhinha de rosa sentou do meu lado. Eu consultava o relógio freneticamente. Não tinha conseguido falar com meus pais. Liguei umas três vezes para cada um. Fazia meditações silenciosas, mas meu desespero parecia aumentar exponencialmente a cada minuto que se passava. Cinco pessoas tinham entrado no consultório. Faltavam trinta e cinco, e eu não enxergava nada, meu olho ardia, e eu já tinha perdido minha aula há muito tempo. Comecei a batutar hipóteses ridículas de que a lente tinha dado uma volta de 180º pelo meu olho, penetrando de alguma forma pelo músculo e indo parar lá do outro lado, ou que ela havia grudado e secado irrefutavelmente na pálpebra superior ou em algum outro lugar que eu não pudesse ver.
Eu estava sozinha e começava a ficar com fome. Meu olho esquerdo já lacrimejava automaticamente por causa da dor e da irritação, mas eu começava a sentir vontade de chorar. Liguei mais uma vez para a minha mãe. Ela não atendeu.
Comecei a bater meus pés, nervosa. Mordi o lábio. Sempre fazia isso quando sabia que não ia conseguir segurar mais. Cinqüenta minutos. Já sentia meus olhos borbulhando de água. Se eu piscasse, as lágrimas iam cair, e eu ia desembestar a chorar descontroladamente.
Estava chorando silenciosa e discretamente, secando os olhos com a beirada do casaco, quando percebi que a velhinha ao meu lado estava com a bolsa aberta e caçava alguma coisa ali. Ela ficou um tempão catucando lá dentro, remexendo. Sua mão tremia bastante e isso dificultava sua busca, mas isso não parecia deixá-la impaciente.
Finalmente ela ergueu a mão, puxando com ela um pacote aberto de halls de menta. Ela se virou para mim com um sorriso doce, os olhos embebidos em compaixão, estendendo a mão trêmula para perto do meu rosto:
- Quer uma balinha?
Achei aquilo demais. Tive vontade de apertar sua bochecha, colocar ela no bolso e levar para casa.
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Aluísio de Azevedo
domingo, 5 de julho de 2009
um dia, por aí...
Só para relembrar, quando tudo isso acabar, que tive o privilégio de presenciar uma cena, cena essa a qual ocasionalmente presenciava às sextas-feiras. Essa insistência só significava uma coisa: que deveria ser tomada nota. Na verdade, acho que tive medo de nunca mais poder vê-la novamente.
Eram 16:37 e o vento lambia meus cabelos, não necessariamente para o lado que eu desejava. Descia a rua México paulatinamente, e de lá de cima ninguém me observava ou por mim era observado. Meu irmão marchava atrás de mim, sem balançar os braços ou emitir algum barulho. O sol caia em cascatas, limpando a rua e arredores, dando vida às milhares de cores que se sobrepunham, enquanto, ao mesmo tempo, me cegava. Gravetos pousados no chão abriam caminhos por entre folhas caídas e pouco pigmentadas, algumas até mesmo secas. Algumas destas algumas dançavam. É incrível como a imagem pode se adaptar com o som que está sendo ouvido. Não é nem preciso muita imaginação.
Árvores grandes, de raízes fortes, se estendiam com harmonia. Suas copas formavam um canal, o qual vez ou outra escondia o sol e o fazia chegar pontilhado aos meus olhos, de acordo com o meu movimento. Não sugavam energia da terra com suas raízes, mas a compartilhavam com ela. A mais óbvia e, ao mesmo tempo oculta sensação de equilíbrio. Era como se aquilo tudo fizesse sentido, como se tudo estivesse tão certo.
Casas escondiam-se tímidas por entre as folhagens. Não conseguia supor que pessoas morariam naquelas casas. Se existissem, passariam anódinas e medíocres; simplesmente se tornariam parte da minha paisagem.
Havia um momento ainda em que não se podia ver o que havia lá embaixo, como uma montanha- russa. Fechei os olhos por uns segundos, e tentei adivinhar.
Sorri. No fim da rua inclinada, começa a estrada. O asfalto iluminado, mas sem ondas de calor na superfície. A temperatura era bem agradável, estávamos no fim do inverno. Desci uns dez metros correndo ou girando. Meu irmão me repreendeu. Quem se importava? O mundo sorria para mim.
Nesse instante, eu pensava, ao som de Scatman, do que não saberiam as crianças. Era como se eu tivesse a sensação de estar diante de algo fabuloso e enigmático pela primeira vez.
E esse momento eu não troco por nada.